“Desejo morrer. Não estou triste. Estaria triste se quisesse encerrar minha existência e não pudesse fazê-lo.”

David Goodall, aos 104 anos, em entrevista coletiva, antes da sua morte assistida, vestiu um blusão com o termo Ageing Disgracefully (“Envelhecendo Desgraçadamente”), bordado no peito.

O cientista David Goodall, nascido em 1914, na Inglaterra, morreu em Liestal, na Suíça, em 10 de maio de 2018, aos 104 anos, de morte assistida.

Prestigiado ecologista e botânico, radicado na Austrália desde 1948, David não sofria de uma doença grave. Mas desejava antecipar sua morte ao ver sua independência sendo reduzida cada vez mais.

“Minhas habilidades entraram em declínio nos últimos dois anos. Minha visão se reduziu muito nos últimos seis anos”, disse David a repórteres na Suíça. “Eu não quero mais continuar vivendo. Estou feliz por ter a chance de encerrá-la amanhã.”

David se ressentiu de ter que deixar a Austrália para fazê-lo. (Ele vivia em Perth, capital da província da Austrália Ocidental, que só tornaria a morte assistida legal em julho de 2021.)

Em entrevista coletiva, antes de pegar o avião para a Suíça, David vestiu um blusão com o termo Ageing Disgracefully, algo como “Envelhecendo Desgraçadamente”, bordado no peito.

“Lamento muito ter atingido essa idade. Não estou feliz. Quero morrer. Não estou particularmente triste. Estaria triste se não pudesse encerrar minha existência nesse momento em que não desejo mais existir”, declarou.

David estava afastado do emprego em tempo integral desde 1979, mas permanecia fortemente envolvido em seu campo de trabalho, tendo editado em seus últimos anos a série de livros Ecossistemas do Mundo, em 30 volumes.

Em 2016, aos 102 anos, David venceu uma batalha judicial para poder continuar trabalhando no campus da Edith Cowan University, em Perth, onde era pesquisador associado honorário, atividade não-remunerada.

Essa disputa por seu espaço de trabalho o teria afetado muito. A universidade levantara preocupações sobre a segurança de David, incluindo sua capacidade de se deslocar.

Mesmo tendo vencido a disputa, David foi forçado a trabalhar em um local mais próximo de sua casa. Ele também teve de desistir de dirigir e de se apresentar em auditórios.

“Foi o começo do fim”, disse Carol O’Neill, ex-enfermeira, representante da Exit International, instituição que auxiliou David em seu deslocamento à Suíça para a realização do procedimento de morte assistida, sob os auspícios da Lifecircle. “Ele não conseguia mais ver os colegas e amigos.”

A decisão de David de encerrar sua existência foi acelerada por uma grave queda em seu apartamento. Ele não foi encontrado por dois dias. Mais tarde, os médicos disseram que ele precisaria de cuidados 24 horas ou então ser transferido para uma casa de repouso.

“Ele era um homem independente. Não queria pessoas ao seu redor o tempo todo, nem estranhos atuando como cuidadores”, disse Carol, da Exit International. “Ele fazia questão de manter uma conversa inteligente com o interlocutor. E queria ser capaz de fazer as coisas de modo autônomo, como pegar um ônibus e ir à cidade.”

A morte assistida de David Goodall atraiu as atenções do mundo para a causa da autodeterminação e do direito de morte com dignidade.

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